sábado, 30 de outubro de 2010

Viagem minha

(...)
haverá ainda os domingos
haverão?
há verão vindo aí
o que tem a ver?
uma coisa com a outra

Matheus, 30/10/10

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Partir est mourir un peu

Quando estás longe, continuas presente em mim. É uma presença que reveste as formas mais diversas: imagens incontáveis, passagens de livros, significações, coisas familiares, marcas na terra; mas o conjunto de tudo isso fica difuso pela realidade da tua ausência. É como se o teu ser se transformasse em lugar, os contornos do teu corpo em horizontes. Vivo portanto em ti como se vivesse num país. Tu existes em todo lado. Nesse país, contudo, nunca te poderei encontrar face a face.
Partir est mourir un peu. Era muito novo quando ouvi esta frase pela primeira vez e logo percebi que ela exprimia uma verdade que eu já sentia. Recordo-a agora, porque a experiência de viver em ti como num país onde é impossível encontrarmo-nos face a face parece-se com a experiência de viver com a recordação dos mortos. O que eu não sabia quando era novo é que nada elimina o passado: o passado vai crescendo gradualmente à nossa volta como placenta da morte.
No país que tu és, conheço os teus gestos, as entoações da tua voz, a forma de todas as partes do teu corpo. Fisicamente, não és menos real, mas és sem dúvida menos livre.
John Berger

sábado, 23 de outubro de 2010

O problema do Rio é que...











... esqueci.

Não fazem ideia do trabalho que me deu escolher as fotos.

domingo, 17 de outubro de 2010

Primaveril

É que a hemorragia - palavra forte essa, que teimo em usar -, meu criado, não tem hora pra acontecer. E é nisso que dá ter um coração sempre aberto: hemorragias - insisto - constantes. estrondosas, desmedidas, apocalípticas. e você nem sabe como posso ser ainda mais violento, se necessário: nunca deixo os sentimentos atrasarem; o problema todo é seu aí com essas palavras, que vivem chegando tarde.

Não me fecho porque, como você sabe, pra tanta lambada que já tomei, levar mais uma ou outra não deve fazer diferença. Além de que, e se eu estiver certo dessa vez? fechando-me, nunca saberemos. E a nossa escolha foi consensual. Fico esperando vocês se acertarem aí. Se ela ainda não quer saber de entrar, os floreios continuam tá?. Já falou do buquê de rosas oferecido? E dos poemas? Olha, o que eu digo tem chegado aí em letras que tropeçam nos dentes pra sair da boca, escorrem por entre os dedos, se embaralham chão afora... O que deu em você, pobre menino? Não sabe traduzir o próprio coração?

Por esses ataques de suor frio, as exaltações, as noites insones reincidentes... ajudaria se você não me culpasse pelas costas.
Tem outra: quem manda aqui sou eu!
Sem mais.


Eu não sabia que faziam tanto barulho, elas - as hemorragias.

"Queria ter coragem de te falar,
mas qual seria o idioma?
Congelado em meu próprio frio,
um pobre coração em chamas"

Matheus - 18/10/10

sábado, 16 de outubro de 2010

Não seria natural.

- Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.
- Natural é encontrar. Natural é perder.

Caio F.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Conversa

Gosto do silêncio que faz a chuva. Esse som molhado, insistente, finito. Do cheiro também gosto, mesmo não sendo mais o de terra molhada. Pode ser o do gato, do cachorro encharcado desfilando, bobo vadio, nesse chão preto, duro como a vida nas cidades.
Chamo de silêncio o que faz a chuva porque abafa o que há de pior na quietude desses centros: essa camada sonora feita dum ronronar contido, poluído e doente dos motores reclamões que correm lá embaixo para todas as direções e vindos de todos os lados. Do cheiro dessa rosnação toda então, nem falo. Falo. Cheiro preto, entupido, que me engasga a garganta e dá um nó que às vezes nem identifico. Fico assim sem saber dizer se é saudade da terra molhada na rua lá fora ou um grito seco preso aqui dentro. “Mas gritar assim? Logo você, tão calmo, compenetrado...” “Pois é. Às vezes a gente acaba desabando um pouco. Desabafando, digo.”

“Um minuto! Vou ali na rua beber essa tempestade.” “?!” “Fica mais fácil de engolir o choro.”

Sei lá, eu devo ser meio hippie.

Matheus Marins, 07/10/10

Soneto do Corifeu

São demais os perigos desta vida
Pra quem tem paixão principalmente
Quando uma lua chega de repente
E se deixa no céu, como esquecida

E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher

Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer de tão perfeita

Uma mulher que é como a própria lua:
Tão linda que só espalha sofrimento
Tão cheia de pudor que vive nua

Vinícius

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Sinais

Sim, lembrarei de você todas as noites enquanto desmaio a cabeça num preguiçoso travesseiro; nas manhãs, antes de começar meu dia, serás também a primeira pessoa na qual pensarei, -antes mesmo de espantar a preguiça contagiosa- vivendo no clichê do desejo. E se a lembrança do pulso me bater na veia, este tenderá a acelerar, levando o que me faz pensar tanto em ti a gritar mais alto pelo que te traz. Pelo barulho, a recordação viria mais forte e neste crescente chegaria a me espancar o peito. Um movimento já se confundindo com o seguinte e quando o músculo já estivesse vibrando, esquecido de pulsar de tão apressado, eu deixaria de reconhecer essas batidas e começaria meu dia.

Tentaria ioga, esvaziaria a cabeça mas o coraçãoaindacheio não sossegaria. Esvaziaria garrafas enchendo cinzeiros sem nunca encontrar o tal amor tranquiloequilibrado, procurado ardente no meio de uma gota ou pingando latejante de qualquer brasa.

Entre brasas e cinzas, sequer conseguiria findar nossa história, tamanhas opções de caminhos para tropeçar... tamanho conteúdo para traduzir e expor nas letras desse moleque aprendiz,.

Matheus, 05/10/10

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Neste modelo político, os governantes do país são um mero (às vezes grosseiro) reflexo de seu povo. Se elegemos jogadores de futebol e comediantes simplesmente por serem populares, não podemos esperar seriedade, pois não podemos nos considerar sérios enquanto “povo”.

Você aí que votou no Tiririca é um(a) menino(a) bobo(a) sem graça e eu gosto tão pouco de você...

Fujo do tema novo do blog e tudo o mais, mas deu vontade de dizer. Logo paro de falar de política.


Matheus Marins, 04/10/10

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O Dia Seguinte

Chamo-me Dilma Rousseff e acaba de sair o resultado da eleição. O salão principal está repleto de paletós e falsos risos vadios. A imprensa se retirou e a festa começa quando o primeiro terno vai pelos ares. Vejo então um companheiro, aliado dos últimos tempos. Aliado político, digo. “É tudo nosso!”, gritam. E tem início uma chuva de roupas. Reconheço um a um os alicerces da campanha. Agora todos mais à vontade, desnudos, crus, desvencilhados de etiqueta, bárbaros, selvagens, desumanos humanos. Corro ao espelho e, por há muito ter aprendido a me ver na terceira pessoa, flagro tudo dobrado, sem saber o que percebia. A roupa sob medida, o broche de ouro no lugar do coração ou o laquê me endurecendo o cabelo, os gestos, os sentimentos e a vida? Havia pupilas dilatadas e a cara cheia de pó branco. “Puta vadia! vem cá!” Lavo o rosto. “Ele é meu parceiro.” Tudo desce pelo ralo. “A gente facilita umas pra vocês.” Incontrolável. “Cadê o pó?” Vozes se misturando. Agora já está feito e não se volta atrás. Descendo pelas escadas da mansão, há whisky, vodka importada, cocaína, whisky, conhaque, erva jamaicana. Vodka importada para boa relação com o exterior. Mais um pouco de pé dos vizinhos colombianos & mercado interno, pra valorizar o produto. E tudo vai se repetindo assim, agressivamente. Subitamente reconheço: há um ponto vermelho que vai se inflando e inflando e se aproxima. Ninguém reparou, mas agora parece um balão a ponto de estourar. Avisto o número 13 pintado na lateral e penso: cuidar da inflação, PIB, alianças etc e tal. Ou não. Nada aqui terá seus moldes arrumados por minhas mãos. Os trabalhadores de poder real estão em volta. Apenas manter a aparência, penso. Um pouco de pé deve ajudar, mas não existe maquiador aqui agora. Apenas tudo exposto. Exposto até por demais. Ministros desaparecendo em viciantes desertos brancos, jovens mulheres abraçadas a peças influentes do partido, depois montando, dançando, se despindo sobre eles. Armaram a festa na mansão. Os rivais políticos não poderiam aparecer. Hoje, nem amanhã e nem depois. O que foi que eu fiz? Tudo ficou assim abatido com toda a confusão do período eleitoral. E eu, que tanto corri, deixei para trás algo de tanta importância neste último passo. Como voltaria a minha vida ao lado do meu companheiro, se é preciso manter tanta aparência perante esse grande balão vermelho? Não se pode voltar atrás, recusar a verba da companhia. Por outro lado, como seguir adiante num caminho tão embolado para não se fazer entendido? Dúvida existencial da primeira presidente do país. Sei que sempre estarei pensando nele. Nas viagens, congressos, entrevistas, discursos, por trás da imagem de pedra feita estátua, lembrarei invariavelmente do meu fiel, primeiro e único grande amor, José Serra.

Vai, desce a página.












































Matheus Marins Alvares 17/9/10